sábado, 30 de agosto de 2008

'Palin has international experience because Alaska is near Russia.' *

Não entendo, nem concebo, nem atino com o raciocínio de McCain. A opção por Sarah Palin ultrapassa-me. Sem reflectir em abundância – é coisa que por estes dias está genuinamente fora do meu alcance, isso de pensar muito (ando muito entretido da vida com a filha do Robert Towne e com o Preminger, e muito preocupado da vida com o meio-campo/ataque que o Benfica por lá tem - sem ironia alguma - e a cismar por que motivo não treina o Rosado com os seniores), soa-me a decisão mui pateta por parte de McCain. Foge-me aqui qualquer coisinha; qualquer coisinha desmedida.

Optam os estrategos de McCain por uma ‘desconhecida’, por uma ‘inexperiente’, e se isto não corta o argumento mor dos republicanos contra Obama, a sua repetida ‘falta de experiência’, também não ajuda a cimentá-lo. (E podemos, como me parece ser intento dos republicanos, discutir a ‘experiência’ de Obama face a Palin; e podemos discutir a legitimidade de Obama face a Palin – um ano de primárias de desgaste excessivo e 18 milhões de votos face a uma escolha de um homem.) Mas há quem esteja, lá e cá, em êxtase com Palin – não sobrem dúvidas, tamanho êxtase pela governadora do Alasca e tamanhos conhecimentos sobre a mesma (eu não os tenho) também me escapam.

Os dois mais óbvios prós de Palin: é mulher e expecta-se que atraia uma imensa maioria de eleitorado feminino a votar em McCain (o que duvido); assegura de vez a base mais conservadora do partido republicano (o que não duvido por um instante).

Presumir que as mulheres (e, em especial, as ‘mulheres de Clinton’, as desiludidas com a não eleição de Hillary Clinton – e Palin fez questão de as mencionar no discurso de ontem) vão automática e massivamente votar em McCain por Palin é comovente e imbecil. As ‘mulheres de Clinton’, portanto, se bem entendi, votarão no bilhete republicano por lá se encontrar Sarah Palin, antiga apoiante de Pat Buchanan em 2000, e crente no criacionismo. É este o raciocínio? Pois não creio que resulte; pois não pode ser este o pensamento de quem quer que mande naquela campanha republicana – não os tenho assim em tão pouca conta. Pois não deixa de ser um juízo do mais redutor e ignominioso que tenho memória.

Adiante: Mondale em 84, qual golpe de génio de McCain, escolheu Geraldine Ferraro e perdeu por 18 por cento para Reagan.

Pergunta justa: era Palin a pessoa mais capaz de entre todos os republicanos (homens ou mulheres) disponíveis para o cargo?
Pergunta justa: fosse a escolha de Obama, não Biden, mas Kathleen Sebelius ou Janet Napolitano ou a própria Hillary Clinton, seria Sarah Palin a escolha de McCain?
Pergunta justa: Katherine Towne ou Estella Warren?
Pergunta justa: ‘Fallen Angel’ ou ‘Laura’ ou ‘Whirlpool’ ou ‘Where the Sidewalk Ends’ ou ‘Angel Face’?, de qual Preminger noir mais gosto?
Pergunta justa: é verdade que McCain conhece quase tão bem Sarah Palin quanto eu e esteve reunido com ela um par de vezes? http://www.youtube.com/watch?v=5DD_Ds_mWjQ

McCain é um maverick, leio, escuto. Nem sempre obediente ao seu próprio partido. Daí a surpresa Palin. Conheço a faceta, respeito-a, aprecio-a (como não?). Aqui não vejo vestígios de maverick. Aqui vejo um laivo de irresponsabilidade.

Dogma: nunca menosprezar a competente até à medula máquina republicana. E mantenho que isto está longe longe longe longe de decidido. Mas a opção Palin transpira a absurdo e/ou desespero de campanha por todo o santo o lado; a selecção fortuita.

Poucas dúvidas restam que a decisão tem muito (tem tudo) de táctica, de reactiva – a reboque da escolha dos democratas por Biden. Entendo de boamente, isto é uma campanha política, para mais, em tese, uma campanha desfavorável como tudo aos republicanos, e o timming do anúncio do vice foi perfeito para quebrar o momentum dos democratas pós convenção (80 mil no estádio, 34 milhões de audiência televisiva). Tudo certo. Mas McCain fez ontem 72 anos – o candidato mais velho de sempre – e é dono de um passado médico delicado. Não era a escolha do seu vice exercício para ser levado com seriedade máxima? E tal não tropeça de pronto num par de encontros entre McCain e Palin?

Mais palpites: Biden deve voltar-se para McCain e Bush e ‘desprezar’ Palin na medida do possível e com a elegância que se exige; importar-se com a governadora do Alasca no dia do debate de vices e deixar, no resto do tempo, Palin a cargo de Hillary (esteja ela disposta a isso) ou outro alguém.

A primeira grande decisão de McCain soa-me a extemporânea, pouco clara, e, pior, cínica até mais não. Ou insana, ainda estou para perceber. Mas em última análise nada disto interessa, e os estrategas republicanos têm toda a razão deste mundo. O impacto da escolha dos vices é imensamente mais diminuto do que se tende a supor – os debates entre McCain e Obama, sim, serão seguramente mais decisivos, muito mais, que isto.

McCain contra Obama, a escolha reside aqui, não em Palin contra Biden. Caramba, Dan Quayle contra Lloyd Bentsen. Dan Quayle, um idiota por maioria absoluta. H.W. Bush, no final, com Quayle a seu lado, ganhou a Dukakis, ganhou a brincar.


* http://www.youtube.com/watch?v=IwWGS73v4_k

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Richard Burton em Bitter Victory, de Nicholas Ray.