sexta-feira, 2 de janeiro de 2009

2008, lembro-me disto (rascunho indecoroso)

Gin Hendricks, evidente, ainda não foi desta que aprendi a gostar de whisky. Pachorra para escrever a apoucar. Uma semana isolado no Alentejo na casinhola fria e mofenta dos meus avós - deu para ler e ler mais. Acidente de carro (faço da distracção ofício). Um primo da minha mãe, o primo Zé, alentejano monossilábico; gente boa numa família à beirinha do colapso. Desiludir amigos (dois, talvez três - lamento um de verdade - fui manhoso, portei-me mal). A saúde do meu velho a deteriorar; eu mais distante dele sem explicação decente. Sebastião Alba e António Gancho. A lei do limpa-pára-brisas no filme do Garrel (pai): como quem diz: K e V (por que é que duas pessoas jovens têm de ser tão estupidamente orgulhosas?, e quando foi que comecei a precisar mais dela do que ela de mim?) Darjeeling e Hotel Chevalier e tenho em Wes Anderson um irmão mais velho (e em Salinger nosso pai (ausente)). A vaca congelada no rio no filme do Skolimowski; a neve e a roupa branca no estendal. Duas cenas no filme do Gray (a inicial e a perseguição à chuva). Mélanie Laurent e Diane Fleri, as duas mais belas do ano no cinema. Usain Bolt: 9.69 nos 100 e 19.30 nos 200 metros. Messi (o melhor do mundo de momento). O amigo Yates (os três dele a que deitei mão); as capas da Vintage, todas elas, dos seus livros. 'Hats', dos The Blue Nile. Palavras mais usadas: 'charolastra' - raptada a um filme que muito gosto -, 'pateta' e 'transumância' - roubada a um colega. Diogo Rosado e o pé esquerdo mais displicente e altivo da última década a pisar Alvalade; um segredo mui apropriadamente guardado. Viagem de um mês: uma tarde amodorrado de ressaca em Podgorica; uma noite em Zadar (com princípios de porrada com um croata que me partiria a cara com murros descartado de preocupação - salvou-me o Artur; obrigado, devo-te essa); boleia de motoreta em Mostar; Berlim, a minha cidade modelo, demente q.b.. Uma Julia aloirada. Istambul que me desfez em suor sujo. Uma puta-guia-turística em Taksim e barba feita à navalha em Beyoglu (seria Beyoglu?, não garanto). Fotografias de Ara Guller; Goran Bregovic ao vivo em Budva; um dinamarquês tresloucado viciado em doces de viagem a Amesterdão. A 'The Black Angel's Death Son' e a 'European Son' dos Velvet. Boston Celtics (22 anos depois). Guardiola (saber e saber estar recompensados), Ibrahimovic e Guti. Os sentimentos mesquinhos e tolos que Ronaldo por cá suscita. Espanha campeã europeia com justeza. Ano de ida a poucos concertos; menos ainda ao teatro. Muita Cinemateca no primeiro semestre; quase nenhuma no segundo. Muito Ford, Lang, Preminger e mais algum Fuller; tornar a olhar com jeito para Cimino. No cinema morreram dois gigantes: Paul Newman e Richard Widmark. Desapareceu Pollack e um actor que cativava: Guillaume Depardieu; gente das letras: o belga Hugo Claus (esquecido em demasia), David Foster Wallace (de Federer a John McCain), Harold Pinter e Dinis Machado. Mais: Isaac Hayes, o Tim Russert da NBC, o Bobby Fischer e Iba N'Diaye (um pintor senegalês que desconhecia por inteiro e recordo por razões cá muito minhas e só minhas). Ray Ban falsos e Sanuk sandals. O meu reino por dois casacos. Descoberta de Jancsó e Iosseliani. Música de Mihály Vig nos filmes do amigo Tarr. Barack Obama: tipo do ano por maioria absoluta. Obsessão minha pelas eleições norte-americanas; a noite madrugada delas e um pequeno-almoço no Galeto com dois colegas. Livro do Joseph J. Ellis: Jefferson e a correspondência com Adams; o duelo Burr contra Hamilton. Rússia/Geórgia. Atrocidades na RD Congo. Atentados em Bombaim. Um ensaio do Pedro Rosa Mendes no Público, 'Timor-Leste: A ilha insustentável'. Captura de Karadzic, fuga sem fim de Mladic e leituras sobre Milosevic. O meu primo Rui, um homem agarotado. A minha tia Nita, com quem passei muito tempo em puto; está velha, não a reconheci por nada quando a revi aqui há um mês ou dois. As broas da minha tia Livita. Duas séries da HBO: Giamatti a fazer de John Adams (vi isto em modo viciado) e In Treatment. Jantares e póquer - jogo no qual sou espectacularmente mau - noite dentro na casa do Zé no Bairro. Vila Praia de Âncora. Morte da minha tartaruga Jakob (nome tirado a personagem central de um romance de Walser). O casamento do amigo Jota. Um, dois, três restaurantes em Campo de Ourique. O Júlio dos Caracóis em Chelas e a Casa do Alentejo. Terror e insónias. Rédea solta a pensamentos e atitudes imbecis. Idas escassas e fugazes a um lar de terceira idade. Colegas de trabalho (da gente impecável - os conselhos do Alex - aos pirados e aos idiotas chapados). Nespresso depois de almoço. Duvel ou Leffe (blonde ou brunne) à noite no sítio de sempre com o amigo de sempre, o melhor, Bruno. A ressaca amorosa de um amigo próximo. A miúda de um bar perto do King que não me liga puto. Sopa miso num sítio improvável por euro e meio. Zubrowka, vodka polaca, à venda no Pingo Doce, um insulto para o estômago por sete euros. Uns brincos que não cheguei a dar, por ali arrecadados. Sonhos de abóbora. Mestrado congelado. Julgo que 2008 não passou por mim à pressa: bem vistas as coisas, tive uns sete ou oito meses maus e o que sobrar bons. Um convite com interesse no final do ano que, inteligente como sou, passei por pavor de falhar. Gosto de desistir; contemplar a derrota sempre foi mais belo; cá lidarei com isso em 2009.

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«I always contradict myself»

Richard Burton em Bitter Victory, de Nicholas Ray.