segunda-feira, 21 de julho de 2008
elogio a John Sayles
Por ter inegável pinta - a minha ambição de vida passa, se chegar à idade de Sayles, por ter um cabelo semelhante, e ficar tão bem quanto ele de camisa de manga curta (é coisa de irem procurar às imagens do Google). Por ter 'n' entrevistas simpáticas no YouTube que revelam sagacidade à farta. Por ser próximo do grandioso David Strathairn (, e de Will Oldham, julgo eu.) Por ter uma carreira literária que desconhecia e com origens já antigas. Por ser, de parelha com Jarmusch, uma das vozes mais independentes e/ou originais do actual cinema americano. (Num patamar júnior a Sayles e Jarmusch, recordo dois nomes: David Gordon Green - que raio tem feito depois das maravilhas que são "George Washington" e "All the Real Girls"? - e Billy Ray - "Shattered Glass / Verdade ou Mentira" e "Breach / Quebra de Confiança".) Por pisar e repisar caminhos que outros seus conterrâneos não ousam. Por interesse desmedido em saber que terra é aquela em que nasceu; que gente de tamanhas diferenças ali habita. Por entender a importância da história mais íntima daquele país; que tal história deve ser escavada, exposta, e, se possível, compreendida. Por bem sentenciar que o passado não é assim tão passado quanto se julga, que os conflitos estão lá, sempre estiveram, nas mais fundas raízes americanas. Por a palavra ocupar lugar central no que realiza, sempre; ou te aborreces ou te vais encantando devagar pelo enredo delicadamente entrelaçado pela mente de Sayles. Por não recear ser político ("Silver City", 2004), nada por nada inocente - e daí correrá supérfluos riscos de impertinência que mais o prejudicam que outra coisa. Por, enfim, arriscar: saber que o sucesso ou o fracasso do que filma, no final, dará igual: winner take nothing (© Hemingway). Vamos pôr ordem nisto: não se pense que tenho por Sayles igual fascínio que tenho por Jarmusch, por exemplo (já que aqui se escreve sobre os ditos heróis independentes americanos). Mas não ver "Honeydripper", seu filme mais recente, em salas portuguesas (nem expectativas disso) é matéria que chegue para me atormentar a noite. Foi por "Lone Star", que vi algures nos meus catorze anos, que o descobri, que pasmado fiquei, e que de engodo serviu para o resto de Sayles; mas foi por "Silver City / Em Campanha" - achado numa Valentim de Carvalho a saldos - que a Sayles, muito tempo depois, voltei. Em boa hora. De subtil, "Silver City", nada tem ou intenta ter: Chris Cooper (outro dos próximos de Sayles) é Bush chapado, Michael Murphy é Bush pai, Dreyfuss lembra Karl Rove, etc., etc.; e admite-se que não será um Sayles de excelência (estou a pensar em "Matewan", 1987, e no já falado "Lone Star", 96). Compensa com um argumento sólido e inteligente. O argumento, precisamente aquilo em que Sayles - o lúcido Sayles, o totalmente lúcido Sayles - mais acredita.
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