quinta-feira, 20 de março de 2008

Hugo Claus

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Soube-o ontem à tarde: morreu Hugo Claus, escritor belga, 78 anos, por eutanásia. Sofria de Alzheimer. Não me choca nem a sua morte física nem a forma escolhida para morrer. (Nem o sabia doente e da última vez que nele pensei, ao tentar arrumar uma incontrolável desordem de livros e de papéis em cima da mesa, imaginei-o feliz da vida algures na Flandres - com uma Duvel ou uma Leffe pela frente.) Choca-me só o desaparecimento de um escritor raro: alguém que descobres, que lês com tal alegria frenética que queres que seja só teu - és um egoísta por excelência nesta matéria -, alguém de quem não te queres desligar nunca. Daí, provavelmente, ter ainda por ler "O Desgosto da Bélgica", romance mais célebre de Hugo Claus, livro para mais de meio milhar de páginas, comprado na última feira do livro em conjunto com "A Caça aos Patos" e "Rumores" (tudo na Asa, tudo barateco; "O Desgosto da Bélgica" ficou por ler para uma época porvir - saber o livro lá, à minha espera, dá-me uma espécie de conforto). Hugo Claus, por "A Caça aos Patos" e por "Rumores", cá ficou algures numa nesga de cérebro como um dos meus escritores. Clube restrito. Acontece de tempos a tempos; Claus era dessa estirpe escassa de escritores: apaixonas-te página a página, pela narrativa inteligente, súbtil, não raras vezes ácida perante o seu próprio povo e país. Assim era a escrita de Claus, nome recorrente nos últimos anos quando se falava de Nobel da Literatura. Era, para mais, poeta, dramaturgo, pintor, e chegou, li algures, a realizar uns quantos filmes. Opto por nem sequer procurá-los, aos filmes, bastam-me os livros - conto agarrar-me a "O Desgosto da Bélgica" por estes dias. Arrisco que Hugo Claus será por cá mais notado pela eutanásia (permitida pela legislação belga), do que por aquilo que escreveu. É uma pena se assim for.

(Este livro de poemas - edição espanhola - tem muito bom aspecto e um título fino que só por si dá capricho de comprar.)

(Reli o texto. Comprometo-me a não repetir obituários do género. São vulgares até ao osso; odeio isso. Nem com o Salinger farei semelhante coisa.)

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«I always contradict myself»

Richard Burton em Bitter Victory, de Nicholas Ray.